Caminhada a três

Para entender o momento presente é preciso entender a origem, e para entender a origem é preciso recorrer à memória. Quando penso no que passou, quando as lembranças começam a vir à tona, abano a cabeça para as afastar. É intuitivo. É a primeira reação. Como uma criança que se esconde debaixo dos lençóis para não dar de caras com o monstro papão que habita no seu imaginário. Percebem a contradição? Se é imaginário, está dentro dela, não fora dela. Estando dentro dela, mesmo que ela se esconda, ele continua lá.
Chamo então essa criança, essa menina, a minha menina interior. E chamo o monstro papão, que habita nela. Sendo ela eu, ele também habita em mim. Vamos caminhar os três, com uma distância considerável, servindo eu de mediadora.
A caminhada não é por isso solitária. Há um acompanhamento interior. O mundo fica para trás, o caos e o medo. 
Ela diz então, timidamente:
- "Não gostam de mim. Não sirvo. Não sou suficiente. Não mereço o amor. Não mereço ser amada. Eu sou a menina que se sentava no pátio vermelho da escola e desejava ser algo que não era. Eu sou a menina que era a última a ser escolhido nos jogos do ateneu." De súbito, um sorriso no olhar.
- "Também sou a menina que gostava de cantar no autocarro durante as viagens de estudo. Não sabia o que era o medo, nem a vergonha naquela altura."
Oh menina leão que perdeste a tua juba algures no tempo!!!
O monstro papão segue em silêncio. Ele não é mau de todo. Quanto tempo demorará ela a perceber?


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