Reflexões - Crise de fé .... Para onde seguir daqui?
Estou numa fase de mudança profunda nos meus credos e fé.
Durante muitos anos - com o início ainda na minha adolescência - deixei-me levar pelo misticismo, superstições e alguma fantasia. Para mim, o outro lado, aquele lado não tão visível, era uma realidade e poderia ser acedido com a prática e disciplina certas. Na minha família havia uma certa crença no sobrenatural pelo que recorrer a curandeiras, a espíritas e tarólogas não era completamente descabido. Talvez isso explique um pouco o meu fascínio!
Adquiri o meu primeiro baralho de cartas de tarot aos 18 anos, uma prenda que pedi aos meus pais. Na altura não o usei muito, mais por preguiça do que outra coisa. Alguns anos mais tarde fui para o yoga, entrei na (e saí da) Nova Acrópole e nos 9 anos seguintes dediquei-me com afinco àquilo que eu chamava de espiritualidade.
Eu preciso de fé, preciso de acreditar em alguma coisa. Pessoalmente, sinto que se não tiver alguma orientação espiritual, será muito mais difícil seguir na vida em paz. Para além disso, e penso que isto é comum a todos os seres humanos, sempre necessitei de respostas às minhas perguntas mais profundas, aquelas que aparecem nas primeiras páginas dos livros de iniciação à Filosofia:
Quem sou eu? De onde venho? Para onde vou?
O que eu vi na minha infância associada à minha ânsia por respostas acabou por me conduzir a este caminho. E talvez por aqui continuasse se, com o passar do tempo, as minhas então certezas não se tivessem tornado numa fonte de angústia.
Já viram certamente a imagem do hamster a correr dentro da roda sem sair do mesmo sítio. Por vezes, sinto-me esse hamster presa às minhas opiniões e vaticínios sobre a existência humana.
Contudo, desconstruir todas estas minhas ideias não tem sido fácil. Hoje, enquanto passava pelo instagram, dei por mim a sorrir enquanto reparava que, lado a lado nas stories, estavam duas pessoas que eu sigo e que não podiam ser mais o oposto: um cientista céptico e uma fervorosa cristã. Podem estar a questionar o porquê de eu seguir estas pessoas ainda por cima quando defendem ideias que se encontram nos dois extremos e a resposta reside exatamente aí. Eu não sei onde está a verdade. A ciência dá-nos muitas respostas mas ainda não explica tudo. Carl Sagan diz que, ainda que a ciência não explique tudo ainda é a melhor ferramenta que temos. Daniel Gontijo, psicólogo e professor doutorado que diariamente partilha vídeos dedicados à ciência e à pseudociência na sua conta do Youtube, afirmou a dado momento que ainda que a ciência não consiga explicar tudo, é mais honesto reconhecer apenas que há coisas para as quais ainda não temos resposta do que tentar imediatamente procurar essa resposta no sobrenatural. Por seu lado, quando procuro a explicação mais religiosa, a tal pseudociência não é tão desacreditada como algo não funciona, mas sim como algo que, ainda que funcione só pode vir do diabo pelo que não devemos recorrer a ela.
Tenho de ser honesta. Nestes anos de imersão na "espiritualidade" nunca me deparei com nada sobrenatural. Muitas pessoas próximas dizem-me que sentem energias ou que já viram espíritos ou ouvem vozes. Nunca tal aconteceu comigo. Neste momento também sei que naquelas alturas em que eu achava que estava a captar algo, na verdade só estava a tentar justificar o caminho que tinha escolhido. Se estás próxima de pessoas que, supostamente, atingem estes níveis superiores de consciência e captam tudo e um par de botas, também queres o mesmo. Queres sentir-te especial. Para além disso, nas imensas formações que fiz sempre fomos muito incentivados a confiar na nossa intuição, a confiar e a acreditar na informação que nos estava a vir. A informação que nos vem é aquela que naquele momento nos vem ao pensamento, ou os insights que vamos tendo.
Ok, tudo isto pode ser verdade mas e se não for?
A idade média, comummente chamada de idade das trevas, foi um período em que a sociedade se virou muito para a superstição. O credo religioso exacerbado conduziu à inquisição, à queima de mulheres na fogueira. O iluminismo, três séculos depois, e com ele a revolução científica, trouxe-nos uma nova forma de pensar e de ver a vida. Mas hoje vejo novamente as pessoas a falarem na recuperação desse saber antigo como se, o que se perdeu tenha significado um grande dano para a sociedade e agora precisemos de nos conectar novamente com a natureza, as plantas, os astros e afins. Nada contra o conectar-me com a natureza. Quem me conhece sabe que não há lugar onde me sinta mais em paz do que na natureza, mas será que esse "saber" é realmente tão importante? Nesses tempos não havia melhor, os cuidados de saúde eram escassos, a idade média de vida era menor. Estando nós agora com acesso a melhor informação fará sentido voltar assim tão atrás?
Há uma imagem que frequentemente aparece no facebook, porque muitas mulheres gostam de a partilhar, em que se vê uma mulher presa a uma estaca e a ser queimada num fogueira. Por norma, a imagem é acompanhada por uma frase que diz algo do género: "somos as netas das bruxas que não conseguiram queimar." Será? Será que é mesmo esta imagem que queremos atribuir a nós mesmas na atualidade e que serão estás "netas de bruxas" a construir um futuro melhor? Pessoalmente, não acredito. O que vejo atualmente é femininismo barato, um sagrado feminino que ninguém sabe exatamente o que significa mas parece giro, e mulheres que não querem ser chamadas de mulheres e homens que querem ser chamados de mulheres.
Enfim. É um tempo conturbado para a minha fé mas ao mesmo tempo fico feliz por sentir estas inquietações porque talvez elas me ajudem a deixar de lado o que não serve.
Quero deixar bem claro que eu não sei onde está a verdade, nem tenho pretensão de achar que sei mais do que os outros. Admito a minha enorme ignorância, mas não posso continuar a caminhar a mesma estrada quando o que vejo nela já não me faz sentido.
(Imagem retirada da net, pode ter direitos de autor)
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